quarta-feira, 31 de agosto de 2016

A democracia do ar-condicionado

Não sou um democrata. Não é um assunto que eu goste muito de ficar colocando em um blog sobre nada, porque o objetivo é ter os assuntos mais aleatórios os possíveis, e política nunca vai ser um assunto aleatório.  A abordagem do tema da democracia é algo o qual já me vem irritando há muito tempo, porque a tomam como uma entidade inquestionável, absoluta, e atacar a democracia é pior que atacar o deus de qualquer religião.
Mas eu já havia pensado em um exercício mental pelo qual todos já passaram em algum momento, e o considerei digno do blog: as votações das pessoas localizadas em uma sala para decidir a situação do ar-condicionado.

Certo, todos levantam suas mãos para dizer o que preferem, o ar-condicionado ligado ou desligado.
Suponhamos que exatamente metade da turma mais um preferem-no desligado, e o resto ligado, em uma manhã relativamente fria de Brasília, com seus 18ºC. Todos os que levantam a mão para requisitar que ele fique desligado não levam em conta a mudança da temperatura que o decorrer do dia irá trazer, às 11 horas a temperatura já será algo em torno de 25ºC ou mais, e aqueles da sala os quais são mais sensíveis a calor começarão a suar, piorando a situação geral. Uma cena nem um pouco agradável.
Suponhamos agora: metade da turma mais um preferem-no ligado, e os outros desligado, nessa mesma manhã relativamente fria de Brasília, com seus 18ºC. Aqueles que levantaram a mão e ganharam a votação podiam estar realmente com calor (o que não só é possível como eu geralmente me encontro nesse grupo), ou podiam estar pensando a longo prazo, para aquilo descrito no parágrafo anterior. Mas vejamos a consequência para todos: nas primeiras horas da manhã, os que perderam a votação vão ficar com frio absurdo em uma manhã a qual já consideram fria, eles saem perdendo até finalmente chegar a tarde, ou saírem da sala.

Qual é, então, a solução certa?

É mais simples do que parece: não fazer uma votação e manter o ar-condicionado ligado sempre. Antes de me acusarem de ditatorial, raciocinem: quando você está com frio, é possível deixar de sentir frio? Sim, basta se agasalhar, ou algo do tipo. Quando você está com calor, é possível deixar de sentir calor por alguma maneira aceitável em sociedade (ou seja, não arrancar a roupa na sala em questão)? Não.
Não é à toa que o frio demorou muito mais tempo para ser controlado pelo homem, ele é por natureza mais complexo. Na física, o desenvolvimento de máquinas térmicas aconteceu antes dos refrigeradores, por exemplo. Inclusive por um grande período da história a compra e venda de gelo era muito cara, porque apenas se conseguia ele indo até os pólos do mundo e cortando-o nos mais diversos sólidos geométricos.
Essa solução não só é simples como mostra como as pessoas passam a deixar de lado a responsabilidade sobre seu conforto para deixar nas mãos de uma probabilidade de vencer uma pequena democracia pelo ar-condicionado. Além de emburrecerem pela pequena democracia (ora, é responsabilidade do indivíduo levar um agasalho se ele é necessário, e além disso, se o ar-condicionado fosse mantido ligado o tempo todo, elas estariam acostumadas a isso), as pessoas preferem depender dos outros a dependerem de si mesmas, é uma coisa curiosa, que renderia um belo estudo psicológico, social, ou o que demônios for. Curiosamente, da mesma forma na vida real, as pessoas preferem abdicar de suas responsabilidades de pagar estudos, saúde, previdência para deixar nas mãos da democracia e do Estado. Isso inclusive é um dos motivos para eu ser quase um monarquista, ou algo do tipo, sem muita precisão, mas sempre antidemocrata.

Infelizmente é preciso frisar que o intuito da publicação não é começar um debate sobre o assunto. Leiam e releiam, não tem nenhuma citação nem estudo sobre isso, é apenas um exercício mental simples. Se realmente quiser uma leitura simples que exponha meu ponto de vista, sugiro o pequeno livro de Frank Karsten e Karel Beckman, Além da Democracia, mas para ser honesto, prefiro que não seja lido se for para fins de discussão, porque quanto menos discussão política, mais saudável é a convivência com pessoas.

Bem, é isso.

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